No mês passado fui olhar com calma para as minhas faturas da MEO, porque elas tinham vindo a subir de valor sem razão aparente.

Ainda bem que fui ver, andavam-me a “roubar” 15,96 € todos os meses com uma coisa chamada WAP Premium.

O que é o WAP Premium?

Na altura em que os telemóveis ainda pareciam tijolos desenvolveu-se a tecnologia WAP (ou Wireless Application Protocol), que era suposto ser a versão da Internet para os dispositivos móveis, e permitia aceder a serviços tipo email, resultados desportivos, notícias e por ai em diante.

Até aqui tudo bem, era uma forma de tornar dispositivos burros um bocado mais inteligentes, no entanto começaram a surgir alguns problemas, nomeadamente ninguém conseguia ver uma forma de ganhar dinheiro com aquilo. Eis que surge a capacidade de pagar por algo usando a conta do nosso telefone.

Agora avançamos no tempo até à altura em que os telefones mais parecem computadores, e onde conseguimos aceder à Internet inteira nos mesmos, e perguntamos se esta tecnologia ainda existe. E a resposta é: claro que sim, agora é uma forma excelente de burlar pessoas.

Na prática uma empresa pode fazer um acordo com um operador de telecomunicações e dizer que quer cobrar aos seus clientes através deste mecanismo, e a operadora (que recebe uma comissão) diz que é para já.

Se a descrição acabasse aqui não existiria problema, mas não acaba. A outra parte desta história é que a tal empresa que quer vender produtos / serviços em cima da plataforma da operadora não necessita de confirmar com o cliente da operadora se ele quer mesmo pagar, bastando que ele visite uma página web com código por trás que faz todo o processo sozinho.

Foi isto que me aconteceu, algures na utilização do meu telefone, supostamente, apareceu uma página de publicidade a uns jogos móveis quaisquer, e eu “supostamente” cliquei num botão que dizia que eu queria pagar 15,96 € por mês para poder jogar esses maravilhosos jogos. Não existe mensagem de confirmação, não existem validação se sou mesmo eu a usar o telefone ou a minha filha por exemplo.

Porque é eu considero isto um roubo?

No Capítulo II do Código Penal Português está o artigo 203º com a seguinte composição:

Furto

1. Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair coisa móvel alheia, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.
2. A tentativa é punível.
3. O procedimento criminal depende de queixa.

E no artigo 210º:

Roubo

1. Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair, ou constranger a que lhe seja entregue, coisa móvel alheia, por meio de violência contra uma pessoa, de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física, ou pondo-a na impossibilidade de resistir, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.
2. A pena é a de prisão de 3 a 15 anos se
3. …

Ora, se olharmos para estas definições, podemos concluir que Furto isto é de certeza, mas será que é roubo?

Eu acho que sim, um dos pontos que os distingue é a forma como apropriação é feita, sendo que uma das características que indica passar a ser roubo é “pondo-a na impossibilidade de resistir”. E é isso que acontece aqui.

Para qualquer pessoa que já utilizou um telemóvel com acesso a aplicações e à Internet, é claro que o comportamento expectável quando existe algum pagamento a fazer é que nos seja pedido para confirmar o mesmo, e colocarmos os nossos dados para pagamento. Mesmo quando as plataformas já têm os nossos dados (com é o caso da Google Play Store no Android ou a App Store no iOS) perguntam-nos se temos a certeza que queremos fazer essa compra.

E outro ponto muito relevante a esta análise é que mesmo com equipamentos topo de gama, todos nós já passamos pela situação em que uma página ou app demora um pouco mais a abrir que quando vamos carregar um sitio onde era suposto estar o botão, quando lá chegamos com o dedo o botão já mudou de sítio. Ou também a situação de estamos a utilizar uma aplicação e de repente aparece o ecrã com a publicidade, e se nós estivéssemos prontos a tocar no ecrã vamos tocar já em cima da publicidade e não na aplicação que estávamos a utilizar.

Por todas estas nuances, sim eu considero que o que estas entidades andam a fazer é Roubo. Estão a retirar dinheiro da minha conta, sem o meu consentimento, e sem eu ter capacidade de resistir.

Como funciona a subscrição?

Infelizmente aqui não existe muito a dizer, basta mesmo só carregar um qualquer botão. E, apesar se eu não ter a certeza, eu acho que nem seque isso é necessário, a empresa pode simplesmente indicar ao operador os números de telefone que quer cobrar.

O aspeto das páginas que supostamente me apareceram é este:

Quais são as entidades que participam neste esquema?

A empresa que me cobrou foi a Buongiorno (não vou colocar links porque não quero lhe fazer publicidade), mas olhando para o Portal da Queixa existem muitas mais.

E tendo em conta que este tipo de negócio deve levantar vários problemas judiciais eu suponho que as entidades que operam aqui estão sempre a fechar e reabrir empresas para o efeito.

Como resolver?

No meu caso sou cliente MEO, e o processo de resolução foi relativamente simples (se bem que ainda não terminou).

Bastou ligar para o apoio ao cliente, indicar o que se passou e indicaram que iriam repor os valores cobrados na minha conta, e perguntaram-me se queria bloquear este tipo de serviços, pergunta que me deixou parvo!!

Eu: “Então mas é claro que quero bloquear isso, se o conseguem fazer porque é que não está bloqueado por omissão?”

MEO: “Porque há clientes que podem querer estes serviços.”

Ora ai está uma resposta parva.

Mas adiante, eu disse que ainda não terminou, porque eles não me devolveram tudo, faltou o periodo atual o que fez com que tivesse de fazer outra chamada.

No entanto essa chamada até foi boa, porque descobri que nos cartões de dados (faz parte do serviço M5O um cartão de dados de 5GB) isto também pode ser ativado, o que é ainda mais extraordinário. Eu posso estar a partilhar a minha rede (com um router 4G) e a pessoa com quem eu partilhei a rede pode estar a contratualizar serviços em meu nome.

Eu admito que não percebo muito de leis, mas isto só pode ser ilegal.

Como prevenir?

Essencialmente aconselho a todos que não o fizeram a ligar para os vossos operadores e pedir para bloquear este tipo de serviços em todos os vossos cartões.

Eu fiz uma queixa diretamente à ANACOM, mas a resposta foi tudo menos elucidadora:

A situação que descreve na sua reclamação será tida em consideração no exercício das nossas competências de regulação do mercado e fiscalização da atividade dos prestadores de serviços. A informação que nos é transmitida pelos utilizadores ajuda-nos a detetar e a corrigir comportamentos irregulares no mercado, bem como a identificar situações em que podemos vir a reforçar a proteção dos utilizadores.

Porque será que a ganância continua a existir?

A tecnologia têm avançado a passos largos, e muitas vezes fico espantado com o que a mente humana consegue criar com estas novas ferramentas, mas casos como este servem para perceber que a ganância nunca vai deixar de existir.

Pensem um bocado nisto. Alguém algures sentou-se e penso que criar uma forma de cobrar automaticamente 15,96 € por mês em troco de nada era possível. Se fosse eu a dizer isto a qualquer pessoa que eu conheça diziam que eu sou maluco. No entanto isso aconteceu, alguém conseguiu por a ideia em funcionamento.

E pelo que li em várias queixas no Portal da Queixa e na ANACOM existem situações onde as pessoas não conseguiram reaver todo o dinheiro que lhes foi cobrado.

Uma das razões pela qual o mundo está no estado em que está são pessoas deste tipo. Alguém para quem o lucro é sempre superior a qualquer outra coisa, incluindo o próprio ser humano.

Conclusão

Liguem para os vossos operadores, e obriguem-os a bloquear estas coisas, se o mercado diminuir drasticamente este tipo de empresas deixam de existir.

E se consideraram este artigo útil de alguma forma, partilhem para que o máximo de pessoas se apercebam desta situação.